quinta-feira, 27 de novembro de 2014

Amor, amizade ou revolução (?)

Fim de ano é aquela correria. Apesar das poucas estreias que me chamaram a atenção nessas últimas semanas (ainda não tive a oportunidade de ver Debi & Lóide 2), e mesmo com a falta de tempo que ando tendo pra escrever sobre filmes (queria tanto falar do box da Versátil lançado com 6 clássicos noir!), queria deixar aqui, pra não me sentir mal com o blog andar nos últimos meses às moscas, um breve comentário sobre alguns filmes que tiveram estreia essa semana no Brasil.

Elsa & Fred ()
Michael Radford, Estados Unidos, 2014
Não tive a oportunidade de ver o original argentino de Elsa & Fred, porém muito me agrada a consciência de Michael Radford em seu remake americano. Dessas pérolas sutilmente divertidas e emocionantes, o filme, que é muito mais uma reflexão sobre como Hollywood enxerga o envelhecimento, trás consigo -para além da singela homenagem ao A Doce Vida de Fellini- um reverencial olhar ao amor sem dimensões, que se eterniza em sua pura forma através do encantador casal protagonista. Ainda que um tanto quadrado em sua estrutura de comédia romântica "pra terceira idade", existe casal mais simpático que MacLaine e Plummer no cinema em 2014?

Os Amigos ()
Lina Chamie, Brasil, 2013

Da safra de filmes nacionais sendo lançados em meio ao turbilhão de produções americanas que ganham praticamente todas as salas de cineplexes e cinemas convencionais, Os Amigos, de Lina Chamie, foi um dos poucos filmes que eu fazia questão de ver (até pelas inúmeras inconveniências que ocorreram pro filme ser exibido aqui). Infelizmente, ficou só a expectativa. Chamie acaba sendo uma espécie de poeta sem tato pro lírico. O filme mais parece um ensaio sobre como escrever um roteiro do que uma experiência contemplativa. Mesmo com um ótimo elenco em mãos (Marco Ricca e Dira Paes, maravilhosos), o resultado beira o amadorismo acadêmico costumeiro desse tipo de produção. Uma pena.

Jogos Vorazes: A Esperança - Parte 1 ()
Francis Lawrence, Estados Unidos, 2014
 
Incontestável sucesso de bilheteria, consequente do exacerbado número de salas em exibição, a primeira parte do último ato de Jogos Vorazes é contrariamente o pior momento da saga. Um filme que não funciona muito bem como prelúdio, nem como suspense. Mesmo sendo um bom diretor, Francis Lawrence não sabe exatamente o que fazer com a apatia de sua protagonista nesse momento tão decisivo da pré-revolução. Apesar de umas boas intenções, o longa não consegue condensar a atmosfera anticlimática, a ponto de que todas as resoluções tendem a ser levadas a um mero capricho dos mais assíduos fãs da saga, que já deram a entender que esse se trata do momento mais assertivo quanto adaptação. Embora seja sempre bom ver Julianne Moore em cena, fica a expectativa que Lawrence contorne o obviês do romance (e dos discursos "revolucionários") do último ato com a parte II no próximo ano.

quarta-feira, 5 de novembro de 2014

[Crítica] Interestelar


Eu sempre fui defensor dos trabalhos do Christopher Nolan.  Apesar de o achá-lo bem mais um maestro que um grande diretor, e ao contrário do que eu li na época, considero até mesmo o último Batman um bom filme dentro de suas irregularidades. Aliás, boa parte dos filmes do Nolan se constrói através de irregularidades, o que nunca impediu a boa recepção deles. A mão firme pra ação sempre conseguiu contornar os equívocos e erros que suas narrativas sempre carregam, e talvez esteja aí o seu brilhantismo quanto maestro do cinema comercial.

Eu não cheguei a ler muito a respeito de Interestelar. Lembro ter visto alguma coisa no começo do ano sobre a escalação do elenco e dos mimos de orçamento, que encheriam os olhos de qualquer estreante, mas não fiz muita questão de saber sobre o que, de fato, o filme se tratava. As comparações inevitáveis com 2001 – Uma Odisseia no Espaço logo começaram a surgir, e Nolan até as usa como condução de seu espetáculo aqui (não só pelos mesmos 169 minutos de duração de ambos os filmes). Sem grandes expectativas, fui pra sessão esperando ao menos ser entretido pela boa dose de ação que sobrecarregam as produções nolanianas. Inesperadamente, nos primeiros minutos do filme eu até pensei estar diante de um cara que pensa o cinema com delicadeza. A atmosfera otimista de ficção científica meio aventureira a lá Spielberg sob um planeta empoeirado em pleno colapso me deixou bastante contente no começo, mas logo o filme ganha aquele tom pesado e os personagens deixam de ser eles mesmos pra tentar dar sentido a textos e mais textos sobre o tempo e a gravidade e o que move o universo. Uma baboseira sem fim.

Mas bem, já que se trata de um filme que se pretende ser uma experiência deslumbrante, os diálogos pouco importam, né? O problema é que nem mesmo em seu campo de conforto (ou seja, na firmeza da ação e construção de um espetáculo visual e sonoro, etc) Nolan parece conseguir extrair alguma coisa promissora.  Primeiro porque querer ser sutil e botar Hans Zimmer tentando traduzir a eloquência de 2001 e sua irretocável composição clássica é uma das heresias mais absurdas de todos os tempos. Segundo, o filme não tem uma sequência de realmente encher os olhos. Pra piorar, nem mesmo o elenco consegue dar um suspiro de relevância à bagunça de ver Nolan filmando uma pretensão sem limites. McConaughey, no entanto, é o único que sai ileso do concerto defasado de autopromoção do elenco (Caine, Chastain, Damon, Hathaway...). Infelizmente, não houve muito que experimentar aqui. Não fosse tamanha a preocupação em dar sentido à trama (que nunca é bem explicada e interessante, de fato), talvez o filme se tornasse um pouco mais suportável. Se por um lado é plausível que Nolan queira se firmar um dos realizadores que mais experimenta a fórmula do cinema comercial, por outro ele deixa cada vez mais evidente o quanto é questionável sua posição de suposto grande autor de Hollywood.



Interestelar ()
Estados Unidos/Inglaterra, 2014, 169 min.
De Christopher Nolan
Com Matthew McConaughey, Jessica Chastain, Anne Hathaway, Matt Damon, Michael Cane, Casey Affleck