Histórias que só existem quando lembradas |
Numa releitura bastante dócil,
diferente da frieza e contemplação presentes em todos os relatos da estória de
Zusak, a visão aérea de Percival para A Menina Que Roubava Livros é a prova de
que o cinema sempre pode se submeter às possibilidades narrativas. Não se
prendendo a detalhes que cabem somente à literatura, e entregando àquilo que é
perceptível aos olhos do espectador, o diretor faz uma acurada construção da
heroína Liesel Meminger – interpretada pela irregular (mas bela) Sophie Nélisse
– sempre deixando que seus anseios e inocência sejam expressos naturalmente em
seus atos, compreendidos por movimentos de câmera tão delicadamente explorados.
Quase um estudo sobre o exercício infantil -curioso e inocente- em meio à
hostilidade de uma Alemanha em guerra, o horror expressionista da atmosfera
visual do filme (sendo o vermelho da bandeira nazista quase um protagonista consequente) se torna por menor meio à relação amigável de Liesel e Rudy (Nico Liersch, encantador), pré-estabelecida
nos primeiros instantes do longa em planos no melhor estilo ‘Steven Spielberg, manipulador de audiências’. Para além da notável competência fílmica de Percival quanto à sutileza dos detalhes visuais,
os problemas de A Menina Que Roubava Livros se desvendam a partir do momento
que seu tato substancial se torna questionável na lentidão rítmica dum segundo momento da narrativa, no qual o
comodismo se faz personagem.
Tão ingênuo e pueril quanto
imperfeito, apesar das entrelinhas e da sensação de fluxo inerte, presente até mesmo na trilha sonora de um John Williams mais do mesmo, o que
Percival e elenco – em especial
Geoffrey Rush e a maravilhosa Emily Watson –
alcançam nessa adaptação bonitinha e eficaz de A Menina Que Roubava Livros é, para além do Cinema em sua forma essencialmente bela e nostálgica, uma forma de amenizar o âmago e a frieza que acomete toda a obra na
qual se baseia. Se por um lado o que potencialmente poderia vir ser uma memorável
adaptação acaba decepcionando por nunca ser ambiciosa o suficiente, a sutileza
de Percival por toda a aventura histórica de Liesel Meminger, em seus 131 minutos,
é - em toda comoção - uma prazerosa (e necessária) experiência.
Não há hora, dia, nem lugar para ser criança |
A Menina Que Roubava Livros (★★★)
Estados Unidos/Alemanha, 131 min, 2013
De Brian Percival
Com Sophie Nélisse, Geoffrey Rush, Emily Watson