quarta-feira, 26 de fevereiro de 2014

[Crítica] Katy B - Little Red


Acho sem sentido falar sobre revolução pop, já que o próprio gênero é revolucionário por excelência, mas se houve mesmo uma revolução pop na década passada, o disco que melhor reflete tal transição é o FutureSex/LoveSounds do Justin Timberlake. Primeiro porque Timberlake praticamente foi precursor da onda electropop que acometeu os anos sequentes do pop mainstream. Segundo, o disco é o pop em sua mais pura forma. Na época das especulações sobre o disco novo da Lady Gaga, o ArtPop, que acabou sendo uma decepção tremenda, muito se falava sobre uma nova revolução pop. Nessa artigo do Pedro Ascar para o Monkeybuzz, ainda que umas obviedades e equívocos tenham sido ditos, há uma linha de pensamento sobre o universo pop mainstream dos últimos anos bastante pertinente, que reflete muito no que as produções independentes de artistas como Grimes, Charli XCX, Sky Ferreira, Icona Pop ou AlunaGeorge –novo clã do pop pintado pela blogosfera alternativa e até mainstream- autointitulam ser pop, e que Katy B não faz muita questão de atestar em suas produções.


Conheci Katy B em meados de 2012, quando ouvi juntos pela primeira vez o On A Mission e o Danger EP, discos que são uma mistura do uk funky tradicional unido a batidas dubstep, muito electropop e reflexos vocais do r&b britânico, e que de forma muito direta quebraram as barreiras do que era quase um nicho pop europeu, ganhando as pistas de todo o planeta e abrindo portas para artistas como Disclosure e Jessie Ware, essa que vem mais na sombra do legado das soul divas pós-Amy Winehouse. Numa entrevista recente pro Alex MacPherson, Katy B fala das raízes que levam sua música ser tão universal e ao mesmo tempo muito própria. A economia das produções e as particularidades que compõem cada verso das canções de Katy B (“I need somebody to calm me down, a little lovin' like Valium”, ela canta em 5 A.M), quase crônicas de um lifestyle, encontram nas batidas de dance-pop a imagem necessária para construção de discos autênticos e sólidos como o On A Mission e seu novo trabalho, Little Red. E jogue a primeira pedra quem nunca foi pra uma balada e terminou a noite completamente bêbado, chorando ou refletindo sobre si mesmo né? O Little Red é justamente um reflexo de sentimentos (universais) sobre o desejo inconspícuo da vida noturna, que instiga e até machuca às vezes. E o grande trunfo de Katy B aqui está na facilidade com a qual ela e seu time de produtores (em especial Geeneus, produtor e amigo de longa data) têm para dissolverem batidas orgânicas. Da nostalgia de Crying For No Reason (quase um hino instantâneo e uma versão contemporânea de Like a Prayer da Madonna), ou o deep house de Aalyah, uma persona sobrenatural que rouba a atenção do namorado de Katy ao se portar de maneira mística numa pista de dança, até o eletrônico progressivo de Emotions, canção na qual ela proclama o desejo de sentir-se viva ao lado da pessoa amada. São sensações, que mesmo partindo dum clichê pop, são transformadas honestamente em matéria-prima das composições, e que me fazem refletir sobre como esse novo disco de Katy, assim como o FutureSex/LoveSounds do Timberlake, compartilham de elementos tão únicos do pop e seus efeitos imediatos, mesmo com propostas muito distintas. Timberlake tinha a ambição das batidas de Timbaland, que transformara seu disco num marco musical, mas Katy B se apóia tanto na sutileza das composições de suas canções, quase ingenuamente até, que faz ser inevitável não elevá-la como maior cronista de anedotas da música pop atual.  

Katy B - Little Red (★★★★1/2)
Rinse/Columbia/Sony, Inglaterra, 2014



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