quarta-feira, 11 de junho de 2014

[Crítica] A Culpa é das Estrelas


Cerca de dois meses atrás ouvi pela primeira vez o disco novo da Lykke Li, I Never Learn. Já conhecia I Follow (Rivers) das noites curitibanas (e daquela bela cena da Adèle dançando-a em Azul é a Cor Mais Quente), e estava ouvindo o Youth Novels a bom um tempo também. O disco, uma espécie de pop pré-fabricado, que se quer ser melancólico, não me pegou como pretendia. Por entre canções onde Lykke Li clama para ser amada como se não fosse feita de pedra, e se desculpa por ter decepcionado seu amante, cantando em coro singular que não há descanso para os mais fracos, o disco parece tão somente preocupado em acertar a veia emocional do ouvinte, que por vezes é possível se sentir diante duma experiência de tortura, na qual o único jeito de se ver livre daquela sufocante atmosfera é se fazer parte dela. O tom sórdido da voz de Li, unido ao flow hibridista das canções, parece ter em sua intenção vontade incessante de se fazer justificável e melodramático, mas tantas são as fórmulas e efeitos injetados nas composições, que o único sentimento ocasionado pela experiência é de estarmos sendo manipulados contra nossa própria vontade. E a dor que se sente e se quer ser sentida pela intérprete acaba tornando-se assintomática.


Curiosamente, esses mesmos efeitos colaterais do I Never Learn são cinematografados em A Culpa é das Estrelas, segundo longa de Josh Boone, que também tem a compositora como uma das coqueluches indies compondo sua trilha sonora.  Adaptação de um best-seller (que não é do Nicholas Sparks, a propósito), o filme dá continuação à sindrome da autoimportância independente que Boone havia introduzido com Ligados Pelo Amor, dois anos atrás. Filme qual o objetivo é ter o espectador em armadilhas emocionais do momento que são apresentados à uma adolescente com câncer, até o momento em que a mesma se torna outra vítima do primeiro amor, A Culpa é das Estrelas é apenas mais um produto industrial a se construir numa áurea confortavelmente terna e (anti)romântica, que no fundo pouco se importa para os personagens que retrata. Assim como no disco de Li, onde a frustração amorosa da intérprete é o fio condutor das composições, Boone expõe as dores da protagonista em seu filme sem em nenhum momento olhar para ela, como se somente através de seu câncer fosse possível criar alguma relação com os desejos e anseios da personagem. Não é à toa, aliás, que Woodley passa o filme inteiro com fios de oxigênios acoplados ao nariz. A Hazel de Woodley, que não é nenhuma garota idiotizada de Tumblr, é interpretada com delicadeza genuína, e a atriz até faz o que pode com a personagem, mesmo acabando sendo tão vítima das artimanhas de Boone quanto nós mesmos. Como Ligados Pelo Amor, A Culpa é das Estrelas assume-se uma obra bem intencionada, especialmente por querer abraçar as dores da protagonista, mas é essencialmente na condução de Josh Boone, que parece tomar boa parte das decisões das personagens, fazendo-as arquétipos dum idealismo vazio, que o drama experimentado pela protagonista se torna meramente um produto (novo) de consumo reciclável. Se existia aqui qualquer valor narrativo, seja pelo amadurecimento precoce de um jovem com cancêr, ou por um relacionamento com prazo de validade, tudo é desconstruído quando logo na primeira cena um off da própria protagonista a apresenta de forma auto-explicativa. É aquela velha síndrome de sofrimento do cinema independente explorada para fins lucrativos.  Se vale alguma ressalva sobre A Culpa é das Estrelas, fica àquela que trás Inquietos do Gus Van Sant à memória pós termino da sessão, e nada além. 

Estados Unidos, 2014, 125 min.
De Josh Boone
Com Shailene Woodley, Ansel Elgort, Laura Dern, Sam Trammell


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