quarta-feira, 25 de junho de 2014

[Crítica] Vizinhos


Desde que vi o videoclipe de Lookin’ Ass, da Nicki Minaj, lá no começo do ano, estive inquieto com a forma irreverente, e ao mesmo tempo consciente, a qual Minaj se expõe por rimas tão violentamente realistas, quanto propriamente tragicômicas. Não leva pouco mais que dois minutos para que Minaj transforme sua expressão feminista num discurso bem mais profundo (e subversivo) da falta de senso do rap quanto à ela mesma. Numa veia que está mais próxima ao politicamente incorreto do que na transgressão de gênero, Lookin’ Ass é praticamente um atestado de autosatisfação, qual Minaj não se importa de ser objeto-de-voyerismo, até porque ela sabe o quão imponente é, mas é essencialmente em sua postura destemível, e na agressividade contida de cada rima que exprime, que ela encontra uma forma de mostrar sua visão sobre o feminismo através do rap, e para além dele, sem precisar se vitimizar pela própria diluição do gênero.


Em contraponto à expressão artística da Minaj, sempre tive uma visão parecida em relação a comicidade do Seth Rogen. Caricatura de si mesmo, e sempre irreverente quanto a própria diluição cômica, Rogen provou ser bem mais que uma risada forçada, ou uma babaca carismático, ao longo das dezenas de filmes que fez em parceria com Judd Apatow e outros diretores do gênero. Dito isso, é estranhamente decepcionante vê-lo tão confortável numa produção como Vizinhos. Direção de Nicholas Stoller (do ótimo 5 Anos de Noivado), e produzido pelo próprio Rogen, Vizinhos é uma daquelas comédias em piloto automático que possui todos os ingredientes (maconha e piadas infâmes rolam soltas aqui) para ser sucesso de público e crítica, mas que falha essencialmente por se construir nessa ilusão. Um pacote de atores que lidam comumente com estereótipos é colocado diante duma trama que parece não querer dizer muita coisa, apesar de ser explicitamente idealista em sua moral. Sobrecarregado de soluções inconsistentes, tanto no que diz respeito à Zac Efron ser uma espécie de boy toy presunçoso com medo do próprio futuro, como o ideal familiar em contraponto de um fetiche do politicamente incorreto, Vizinhos soa como uma continuação desenfreadamente esperta e sem propósito de Ligeiramente Grávidos, de Judd Apatow, só que sem toda a genialidade e sensibilidade do mesmo. É curioso, aliás, como a falta de Apatow na produção empobrece a dissolução concomitante cômica e dramática de Stoller, que ao contrário daqui, tinha sido bem mais singelo e crível em 5 Anos de Noivado. Apostando em piadinhas espertas e referências pop, que mesmo bem estruturadas e (quase) sempre consistentes, são meramente um alívio cômico; a trama de Vizinhos é um espetáculo de banalidades desprovido de qualquer consciência, estética ou narrativa, qual se justifica somente pelo deslumbre de Stoller e Rogen, e um cinismo que se quer ser inteligente. Apesar do enredo fértil e das situações promissoramente divertidas, Rogen e Stoller -ao contrário de Minaj, que soube diluir sua imagem de forma extremamente inventiva- assumem em Vizinhos uma versão bem menos interessante, e discutivelmente emblemática, de si mesmos. 

Vizinhos (★★1/2)
Estados Unidos, 2014, 100 min.
De Nicholas Stoller
Com Zac Efron, Seth Rogen, Rose Byrne, Dave Franco



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